#InFocus
Arte e resistência: a cultura drag queen
em suas nuances
Por iFox/Micael Machado (micaelaraujomachado@gmail.com)
Em Pelotas,
ao redor do Rio Grande do Sul, no Brasil ou até no mundo, há a
construção de questionamentos em relação aos estereótipos que, sobretudo, são
capazes de abrir espaços para que as minorias possam manifestar suas vozes.
Nesse contexto de luta, surge o pelotense, Gengiscan Pereira, 21 anos,
formando em Teatro que criou a sua irreverente Abigail Foster, há cerca
de dois anos. No que diz respeito à identidade e funções pertencentes aos
papéis de gênero, o entrevistado com a sua persona, está na vanguarda dessa
discussão, escancarando conceitos que atualmente estão sendo revistos e
desmantelados aos poucos.
Fora dos padrões
estipulados pela sociedade, ser drag automaticamente abre debate sobre diversos
preconceitos, incluindo, o machismo. Abigail Foster por si só, se afasta
do padrão “pop, sexy e magra” que muitas drag queens são inspiradas, aliás, o
nome Abigail é uma homenagem à Bibi Ferreira, atriz brasileira,
enquanto o Foster, vem de Sutton Foster, atriz da Broadway.
Compor um
personagem é um processo que exige muito de cada ator. A criação de um
personagem (ou figura) real e capaz de expressar a natureza humana em toda
complexidade precisa ser pensado e construído em todas as camadas. Para Gengiscan
não é diferente, Abigail nasceu complexa, o confrontando com conflitos e
desafios. Dona de uma personalidade própria, é uma atriz que se inspira em
todas as atrizes, sejam antigas ou contemporâneas, ora se apresentando com um
visual mais vintage e datado, ora com referências de hoje em dia.
![]() |
(Foto: Vinicius Vaniel/Arrive e iFox365) |
“A Abigail
Foster é uma máscara que eu visto, uma personagem que interpreto e não um
espírito que encarna em mim. Há trabalho de ator, consciência nos atos e
trabalho de corpo e voz nas ações”. Ao analisar a personalidade civil e drag, a
linha é tênue, segundo o entrevistado, a Abigail nada mais é que um exagero
de muitas coisas da personalidade do Gengiscan Pereira onde desejos,
ideias e gostos, são elevados à 50ª potência. Apesar de muitas semelhanças, o
formando de Teatro ressalta que língua dela é mais afiada.
Com a composição
de cada personagem, a cada performance, o trabalho também é detalhado, contendo
inúmeras camadas, é visto fatores como o contexto do que vai ser apresentado e
como se deseja apresentar aquilo. Em geral, é uma dublagem de música, no
entanto, engana-se quem pensa que é somente movimentar os lábios, Gengiscan afirma que treina durante
horas, por muitos dias, aprendendo a letra e não somente isso, as batidas da
música com suas nuances. Logo, pode-se constatar que o ensaio é árduo, desde o
momento em que é criado o conceito da performance, as emoções a serem expressas
para serem passadas ao público junto as mensagens, carregadas de emoções, são
somadas ao figurino, peruca e acessórios em prol de verossimilidade.
Diante do
trabalho performativo, Gengiscan
afirma que há um certo “não entender” por parte do público e isso, é atribuído
ao fato de justamente ele com Abigail
não obedecer aos padrões “pop” que a maior parte das drag queens seguem. Com
exceção disso, a quantidade de fãs adquiridos ao longo de dois anos de carreira
é relevante e, muitos desses, respondem positivamente com muito apoio, em
diferentes segmentos de eventos.
Fiódor Dostoiévski já dizia que aos olhos do artista, o público é um mal necessário, que precisa ser vencido e nada mais. Vestido de Abigail, a sensação do artista pelotense, se assemelha a do escritor e jornalista russo o medo sentido por ele não é um medo assustador que o faria desistir ou não subir, mas, um medo que não há controle: a reação do público. Contudo, a adrenalina é ótima e combustível fundamental para continuar.
Entre tantas
lutas contra o preconceito mascarado ou por meio de reações efusivas, a
aceitação e o respeito da família foi algo conquistado após muitos embates para
que houvesse entendimento do que é “ser drag queen”. Gengiscan relembra
as muitas brigas que aconteceram e, que ainda o deixam mal, mas, fica muito
feliz ao ressaltar que atualmente, os familiares já assistem as suas
apresentações, dão apoio e prestígio ao seu trabalho.
Para que a
cultura drag continue se reafirmando e quebrando tabus, o conselho é incisivo:
“Não se renda às regras de como se fazer drag, não deixe que a massificação das
coisas faça com que o discurso político tão intrínseco à arte drag se perca”. E
não para por aí, colocando o dedo na ferida, questiona o motivo de muitas drags
não estar engajadas em causas sociais pois, enxerga a arte drag como o Bruno
com a sua Ostara London, uma arte de militância e representação da
comunidade LGBT+, o ser ou fazer drag que não precisa ser “além da arte” porque
essa arte, é política.

Nenhum comentário: